A hospitalidade em O Barão, de Branquinho da Fonseca
1. Epígrafes
"O engajamento político não deve ser finalidade, mas acidente na arte" ( Fernando Pessoa)
"O ideal do Artista nada tem com o do moralista, do patriota, do crente ou do cidadão. Quando sejam profundos e quando se tenham moldado a uma certa individualidade, tanto o que se chama um vício como o que se chama virtude podem igualmente ser poderosos agentes da criação artística (...). A finalidade da Obra será, consciente ou inconscientemente, a finalidade estética" ( José Régio)
A originalidade na Arte, o brilho do Presencismo aparece em obras singulares que não se submeteram a um esteticismo programático. O Barão (1942), de Branquinho da Fonseca (pseudônimo de Antonio Madeira, 1905 - 1974) é o melhor exemplo disto.
Segundo David Mourão-Ferreira, Branquinho da Fonseca, como poeta do Presencismo, caracteriza-se pelo “reiterado pendor para a visão alucinatória do concreto e para a expressão aparentemente cândida do insólito.”
2. Elementos narrativos em O Barão: as personagens, o foco narrativo, o espaço, o tempo, a trama
Trecho do filme O Barão, de Edgar Pera (2011)
DISCUSSÃO:contar um mito é recuar à origem das coisas através de uma história
MARIALVA: "Cortesão animalesco (nestas casas não se lê um livro, esta gente nunca lê", Beckford, Diário), comendo ("duas dúzias de perdizes a uma só refeição", idem) entre dois baldes para despejar o que o bucho não consinta, bocejando missas e responsos, o marialva faz gala do terra-a-terra como reacção ao requinte intelectual do burguês ou do aristocrata esclarecido.
Ali onde o vemos é homem de músculo, senhor da sua palavra. Ponhamo-lo na praça com botas e esporões, rabo espetado, chapéu de crista: um galo. Estudêmo-lo na conservação do lar: um honrado.(José Cardoso Pires, Cartilha do Marialva)
Nada na mão algo na v'rilha remancho as noites
e troto os dias entre tabaco viris bebidas fraco mas forte de muitas vidas.
(Que eu já dormi co'as duas mães e as duas filhas que vão à missa com três mantilhas) ...
Bebo contigo cerveja uísqui p'ra que se veja mais rubra a crista
Nada na mão algo na v'rilha invisto contra o zero puro da minha vida e duro, duro!
(Alexandre O´Neill)
HOSPITALIDADE: ato de acolher, de receber um hóspede em casa. Ser hospitaleiro significa hospedar bem àquele que não é da nossa família. Mas, segundo Jacques Derrida, “o estrangeiro é, antes de tudo, estranho à língua do direito na qual está formulado o dever de hospitalidade (...) Ele deve pedir a hospitalidade numa língua que, por definição não é a sua, aquela imposta pelo dono da casa, o hospedeiro, o rei, o senhor, o poder, a nação, o Estado, o pai etc. Estes lhe impõem a tradução em sua própria língua, e esta é a primeira violência. A questão da hospitalidade começa aqui: devemos pedir ao estrangeiro que nos compreenda, que fale nossa língua, em todos os sentidos do termo, em todas as extensões possíveis, antes e a fim de poder acolhê-lo entre nós?” (DERRIDA, Anne Duformantelle convida Jacques Derrida a falar da Hospitalidade. São Paulo, Escuta, 2003)
ALTERIDADE (do latim Alteritas, “ser outro”, “colocar-se ou constituir-se como outro”).
Segundo Lévinas, quando o outro é percebido como Alteridade torna-se absolutamente Outro, incompreensível, transcendente e incontornável, fonte das grandes experiências de vida e base genuína da ética. (...) A forma de ver o mundo a partir de si mesmo, negando a Alteridade do Outro, é chamada por Lévinas de pensamento totalizante ou Totalidade. Contudo, é impossível viver fora da Totalidade (a identidade que formou meu ser). Por outro lado, a Totalidade não pode ser base para a ética ou a relação com o Outro. (...) O Outro é sempre estrangeiro para mim, ainda que seja irmão, vizinho ou viajante. Mas a visão do Rosto, quando acontece, sempre surpreende, pois é visão do Outro nunca antes percebida que rompe minha Totalidade e minha ingenuidade. Deixamos de ficar “lado a lado” e ficamos “face a face”. (...) A violência é uma das chaves para o entendimento da ética da Alteridade de Lévinas, pois a redução do Outro ao Mesmo sempre gera algum tipo de violência que parte daquele que recusa ou reduz a Alteridade. (Emmanuel Lévinas: Introdução à Filosofia da Alteridade)
"A hospitalidade tem sempre a hostilidade como horizonte"
Visser (1990) liga o relacionamento entre o anfitrião e o hóspede através da raiz linguística comum dos dois termos. Ambas se originam de uma palavra comum indo-européia (ghostis), que significa “forasteiro” e, por meio disso, “inimigo” (hospitalidade e hostil possuem raiz similar), mas a ligação expressa neste termo simples “refere-se não tanto ao próprio povo, ao hóspede e ao anfitrião, mas ao relacionamento entre eles” (p. 91). É um relacionamento baseado nas obrigações mútuas e, em última análise, na reciprocidade. Enfim, o hóspede torna-se o hospedeiro em outra ocasião. (LASHLEY, C. MORRISON, A. (Orgs) Em busca da hospitalidade: perspectivas para um mundo globalizado.)
Mircea Eliade explica, em seus escritos sobre mitos que "Os participantes da festa tornam-se contemporâneos de um tempo mítico" (O sagrado e o profano).
Sobre a cena da tuna:
Nas cidades com universidade é comum haver capas negras em festa pelas ruas e grupos de estudantes a cantar baladas e serenatas a quem passa, ou sob janelas de raparigas, de noite e de dia, o ano inteiro. As tunas são onipresentes na vida e tradições académicas e nas cidades que habitam.
Tuna da Faculdade de Medicina, Coimbra
Tuna Académica da Faculdade de Direito do Porto - Burguesinha (2014)
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